Pinheiros e os bairros caminháveis
Uma celebração ao caminhar urbano foi o tema que norteou o bate-papo promovido pelo MOS Convida, programa de visitas a galerias e espaços de arte e arquitetura, no último dia 22 de novembro. O evento, que aconteceu no Unibes Cultural, próximo ao nosso projeto Sabino, contou com a presença da arquiteta Camila Raghi, da Refúgios Urbanos, do jornalista e colunista da Folha de S. Paulo Mauro Calliari e de Bianca Antunes, autora do livro infantil “Vou a pé”. Na ocasião foi celebrada a impressão de nova tiragem do Pequeno Guia Notável de Pinheiros, que teve o patrocínio da MOS e foi produzido pela Refúgios Urbanos.

“Pinheiros é um dos bairros mais antigos de São Paulo, sua fundação data do século 16, de uma aldeia jesuítica onde hoje é o Largo da Batata”, contou Camila Raghi. Segundo ela, o Guia é um compilado do que é mais relevante em termos de memória, arquitetura e história. “A ideia é colocá-lo debaixo do braço e sair sem lenço e sem documento descobrindo o bairro. Essa mistura de antigo, contemporâneo, boa arquitetura, vida cultural interessante, gastronomia intensa. Quem não é apaixonado por Pinheiros?”, disse a arquiteta.
Ela compartilhou com a plateia diversas dicas culturais presentes no Guia, entre eles o Beco do Lira, situado entre as ruas Henrique Schaumann e Lisboa. “Lá tem obras de grafiteiros muito celebrados. O beco é tão rico artisticamente quanto o Beco do Batman, que recebe turistas do mundo todo, mas pouco conhecido.”
Bianca Antunes, que atua implementando políticas públicas para a primeira infância e é autora do recém-lançado “Vou a pé”, livro infantil sobre olhar a cidade do ponto de vista da criança, falou sobre a caminhabilidade de Pinheiros. “O que torna uma região caminhável são as oportunidades de estar que o caminho oferece. Um banco, uma praça. Isso contribui também para a sensação de segurança.”
Ela também refletiu sobre o papel decisivo dos pequenos nos espaços públicos: “As crianças são o medidor de qualidade ambiental de um bairro, de uma cidade. Se tem criança na rua, você sabe que aquele é um bom lugar”, disse, citando a praça Horácio Sabino – que dá nome ao nosso edifício Sabino – como exemplo.

Para Mauro Calliari, que além de colunista da Folha de S.Paulo é doutor em urbanismo pela FAU-USP e autor do livro “Espaço Público e Urbanidade em São Paulo”, a maior parte das cidades se define pelos espaços públicos. “A ágora grega define Atenas. É a partir da praia que Santos cresce. As ruas de Paris são o retrato da cidade. Cada cidade tem sua identidade ligada aos espaços públicos. É neles que a gente se encontra, cresce e se conhece”, disse, concluindo que o espaço público tem a ver também com a nossa própria identidade. “Quando temos medo do espaço público, passamos a ter medo do outro e deixamos de crescer. Podemos escolher entre sermos seres que se abrem e seres que se fecham.”
Ativista da ONG Cidadeapé – Associação pela Mobilidade a Pé em São Paulo, Calliari citou cidades pelo mundo que são referência em caminhabilidade: “Buenos Aires, Bogotá, Veneza, Nova York, Portland. No Brasil: Curitiba, Porto Alegre, qualquer cidade litorânea. Hoje não se pergunta mais onde é o centro da cidade, mas onde é o calçadão”.
Por fim, Bianca defendeu a necessidade de resgatarmos o hábito de flanar pela cidade. “Ao caminhar, a criança brinca com uma frutinha no chão, ela se pendura num gradil, ela pega uma pedrinha e põe no bolso. É um pouco esse o espírito do flanar. Nós adultos perdemos isso. Estamos sempre atrasados, distraídos. Precisamos nos abrir mais para olhar a cidade.”
Mauro citou os filósofos alemães Walter Benjamin – “Os flâneurs transformaram o tempo últi em tempo inútil” e Friedrich Nietzsche – “Meu escritório são as minhas pernas”, e lançou um questionamento à plateia. “Acho que hoje o desafio é pensar o seguinte: no dia em que vamos sair para fazer algo, conseguimos dedicar um pouquinho de tempo a nos perder?”.
Como dizia a escritora Clarice Lispector, “perder-se também é caminho”. É este, afinal, o convite do Pequeno Guia Notável de Pinheiros.
